terça-feira, 31 de maio de 2011

Amando e carpinejando

Levante a mão, ou comente aqui, quem não se identificar com uma vírgula do texto do sempre brilhante Carpinejar. 


 


INJUSTIÇA

Arte de Cínthya Verri


— Não confie na frase de sua avó, de sua mãe, de sua irmã de que um dia encontrará um homem que você merece.

Não existe justiça no amor.

O amor não é censo, não é matemática, não é senso de medida, não é socialismo.

É o mais completo desequilíbrio. Ama-se logo quem a gente odiava, quem a gente provocava, quem a gente debochava. Exatamente o nosso avesso, o nosso contrário, a nossa negação.

O amor não é democrático, não é optar e gostar, não é promoção, não é prêmio de bom comportamento.

O melhor para você é o pior. Aquele que você escolhe infelizmente não tem química, não dura nem uma hora. O pior para você é o melhor. Aquele de quem você procura distância é que se aproxima e não larga sua boca.

Amor é engolir de volta os conselhos dados às amigas.

É viver em crise: ou por não merecer a companhia ou por não se merecer.

Amor é ironia. Largará tudo — profissão, cidade, família — e não será suficiente. Aceitará tudo — filhos problemáticos, horários quebrados, ex histérica — e não será suficiente.

Não se apaixonará pela pessoa ideal, mas por aquela que não conseguirá se separar. A convivência é apenas o fracasso da despedida. O beijo é apenas a incompetência do aceno.

Amar talvez seja surdez, um dos dois não foi embora, só isso; ele não ouviu o fora e ficou parado, besta, ouvindo seus olhos.

Amor é contravenção. Buscará um terrorista somente para você. Pedirá exclusividade, vida secreta, pacto de sangue, esconderijo no quarto. Apagará o mundo dele, terá inveja de suas velhas amizades, de suas novas amizades, cerceará o sujeito com perguntas, ameaçará o sujeito com gentilezas, reclamará por mais espaço quando ele já loteou o invisível.

Ninguém que ama percebe que exige demais; afirmará que ainda é pouco, afirmará que a cobrança é necessária. Deseja-se desculpa a qualquer momento, perdão a qualquer ruído.

Amar não tem igualdade, é populismo, é assistencialismo, é querer ser beneficiado acima de todos, é ser corrompido pela predileção, corroído pelo favoritismo. É não fazer outra coisa senão esperar algum mimo, algum abraço, algum sentido.

Amor não tem saída: reclama-se da rotina ou quando ele está diferente. É censura (Por que você falou aquilo?), é ditadura (Você não devia ter feito aquilo!). É discutir a noite inteira para corrigir uma palavra áspera, discutir metade da manhã até estacionar o silêncio.

Amor é uma injustiça, minha filha. Uma monstruosidade.

Você mentirá várias vezes que nunca amará ele de novo e sempre amará, absolutamente porque não tem nenhum controle sobre o amor.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

No Dia do Defensor Público minha homenagem...

Se minha mãe fosse viva com certeza hoje ela diria "vai lá e escreve alguma coisa, tu escreve bonito". Pois é, hoje eu tenho que escrever alguma coisa, pois hoje é o Dia Nacional do Defensor Público.

Se o meu texto vai sair bonito ou não eu não sei, apenas sei que bonito mesmo é o trabalho destes profissionais. Eu sou suspeita para falar (logo vocês vão entender o motivo), mas a sociedade, o povo, reconhece esta instituição!

Este ano o Tribunal de Contas do Estado (TCE) encomendou uma pesquisa sobre o grau de confiança dos gaúchos em relação a sete instituições. Entre elas estavam a Defensoria Pública do Estado, Polícia Federal, Ministério Público, Assembléia Legislativa, Tribunal de Justiça e Tribunal de Contas da União. A Defensoria ficou em segundo lugar, perdendo somente para a Polícia Federal, mas desbancou órgãos extremamente importantes para a sociedade, como o próprio Tribunal e até mesmo o parlamento gaúcho, afinal somos nós que elegemos os deputados!

Quer reconhecimento maior que este? Sim, acredito que existe um reconhecimento maior que este. Eu não sou defensora pública, muito menos sou da área jurídica, mas cresci praticamente dentro da defensoria e me sinto no direito de afirmar que o maior reconhecimento para um defensor é quando um cidadão o procura.

Neste Dia do Defensor Público um filme de minha vida se passa aqui dentro da minha cabeça e do meu coração. Muitos sabem que minha madrinha é defensora e que minha mãe trabalhou muitos anos na DPE.

Lembro do dia que fugi de casa com meu avô. Usávamos pijama e saímos da Rua Duque de Caxias para ir até a sede da DPE que ficava na Rua Jerônimo Coelho. Também me recordo da mudança para atual sede da  Rua 7 de Setembro.

É muita história para contar! Mas hoje eu quero é parabenizar todos os defensores públicos e em especial a Dra. Cleomir de Oliveira Carrão. Sim, a minha madrinha, mais conhecida como dinda Cléo.

Em 1994, durante o governo de Alceu Collares, nasceu a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul graças ao trabalho dela e de uma série de colegas que deram vida a esta instituição. Minha dinda foi a primeira Defensora Pública Geral do Estado. Tenho muito orgulho disto, pois além da importância do trabalho dos defensores lá estava uma mulher mostrando que nós (mulheres) podemos!

Eu poderia anexar aqui o seu currículo, contar da vez em que ela foi Subdefensora no governo Olívio Dutra, ou até mesmo de quando foi presidente da Associação dos Defensores Públicos. Mas não acho necessário, pois quem está com 68 anos de idade e ainda trabalha de segunda à segunda com amor e entusiasmo por suas causas, sendo que já poderia estar aposentada, não precisa de apresentações!

                     Imagens extraídas do Informativo da ADPERGS - Sexta Edição




Dinda,

Tu és um exemplo de mulher e de profissional. Não escolhi o direito como profissão, às vezes acho que um dos teus maiores sonhos na vida era me ver formada em direito. Mas espero ser uma jornalista com pelo menos 10% da competência profissional que tu tens. E também espero que enquanto jornalista eu possa dar mais notícias boas do que ruins em reportagens que estejam ligadas a área do direito. Não fique brava por eu revelar tua idade. Tu não tens nenhuma plástica, nenhum botox, nada destas invenções que a medicina estética criou. As mais lindas expressões que uma mulher pode ter no rosto e no corpo são as do tempo. Tempo dedicado a família, ao trabalho, aos amores, a vida!
Parabéns pelo teu dia. Que a luta dos defensores continue. Vida longa a Defensoria Pública!


P.S: Dedico este texto a duas pessoas que foram importantes para a história da DPERS: Arminda Vitória e Tânia Cauduro.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Longe do mar

Já senti muitas dores. Dores físicas, dores do corpo, dores do coração e dores da alma. Quem aqui não sentiu algum tipo destas dores uma vez na vida né? Mas como dói quando todas elas se misturam!

Sabe quando a gente pega um punhado de areia nas mãos e vê ela escorrendo pelos dedos? É assim que estão escorrendo todos os meus sonhos. Eram sonhos que já tinha, sonhos que construí, sonhos meus, sonhos nossos.

A areia escorreu pra dentro de um buraco bem fundo. Buraco este onde eu também estou. E sabe aquela dor que citei no início do texto? Pois é, esta dor me deixou inerte. Quando o corpo e o coração estão quebrados em pedacinhos fica difícil sair daqui.

Achei que tudo aquilo estava mais perto de mim. Mas simplesmente do dia pra noite aquilo tudo está mais longe do que posso imaginar. Tão longe que já nem enxergo mais a casa, a cama, a cidade e o mar.

É amigos, já viram algum peixe que cai na areia bem longe do mar se salvar?

sexta-feira, 6 de maio de 2011

MÃE SAUDADE, por Luiza Carravetta


Pensei, pensei, pensei...Procurei várias palavras para começar a escrever este post e não encontrei. Então apenas irei explicar a história. Recebi o e-mail abaixo de uma querida professora de faculdade. A Luiza Carraveta é com certeza uma das professoras que mais marcou minha vida acadêmica.

O E-MAIL


Dear Natália,

Eu sempre te senti guerreira, plena, sensível, competente, amiga, generosa. Eu acompanhei o teu crescimento no Curso, desde o teu envolvimento no DA (Diretório Acadêmico), até as tuas atividades na sala de aula. Entretanto, a tua evolução como pessoa, principalmente no lado espiritual, me permite te colocar num lugar especial no meu coração. Eu percebi o teu envolvimento com a tua mãe no semestre passado e o quanto foste importante para ela.

Tenho certeza de que de onde ela está, ela olha por ti, cheia de orgulho e de felicidade plena.
Eu jamais vou esquecer da participação dela na nossa Mostra de Vídeo. Foi muito importante a presença dela com a gente. Confesso-te que fiquei emocionada. Que bom que ela pode participar de uma das tuas realizações acadêmicas e que bom que eu pude estar junto. Tenho bem presente a lembrança dela, das palavras e do abraço caloroso que trocamos.

Estou te encaminhando um texto meu. Podes ter certeza de que as nossas mães são eternas, pois nunca morrerão em nossos corações.Conta comigo sempre, como tua amiga de verdade.

Kisses.Luz e Paz.
Luiza

*

Minha professora citou um dos momentos mais felizes de minha vida. No final de 2010 minha mãe mesmo doente foi até a minha faculdade assistir os documentários que produzimos naquele semestre. Saiu de casa e da cama, enfrentou suas dores físicas e foi!

Foi um dia muito especial pra mim. Minha mãe já conhecia minha faculdade, já tinha ido até a Unisinos, mas naquele dia ela conheceu a Luiza, alguns outros professores, meus colegas e principalmente meu trabalho.

Eu já estava ciente da gravidade da sua doença e fiz o possível para que ela estivesse lá pois não tinha certeza se ela conseguiria estar na minha formatura. Na foto abaixo um registro deste dia. Minha mãe, Dona Leda (outra mulher fantástica, que originou meu documentário), eu e minha amada amiga Natália Longoni.

O texto que a Luiza cita no e-mail é lindo. Vou compartilhar ele com vocês porque tudo o que eu gostaria de dizer para vocês nesta dia das mães está no texto!


MÃE SAUDADE

Luiza Carravetta

Aproxima-se mais um “Dia das Mães”. Com os apelos frenéticos do comércio, é impossível passar incólume pela data. Entre super ofertas, encontram-se roupas, sapatos, perfumaria, utilidades e “inutilidades domésticas” (aquelas que só ocupam espaço e que nunca são usadas). Além disso, muitos brindes, como sorteio de viagem, passeios inesquecíveis, carros e outros tantos mimos são disponibilizados para atrair filhos, preocupados em homenagear as mães, comprando presentes e podendo, ainda, agraciá-las com a participação em sorteios.

E é neste clima, em meio a muitas compras e a pacotes multicores, que fico pensando no verdadeiro sentido do dia a dia das mães. Ao invés de coisas materiais, como seria bom o aconchego do abraço, o olhar de cumplicidade, o divertir-se com as alegrias cotidianas, a conversa ao pé do ouvido, os conselhos, as broncas, as concordâncias e discordâncias no bate-papo, a partilha, conseguida nas refeições.

Mas há, também, as lembranças e relembranças das mães saudade. Se, fisicamente, elas não estão mais aqui, as suas marcas são fortes e indeléveis nos corações de seus filhos, pois mães nunca morrem, somente mudam de dimensão.

No diálogo do silêncio, a voz é audível, pois se escuta a voz de mãe, quando se quer, podendo usufruir de todas as suas inflexões e nuances e até escolher os seus melhores momentos. Daí advém as orientações, as direções, os caminhos a seguir.

Na memória olfativa, há o cheiro inconfundível de mãe, com aquele perfume exalando na proximidade do corpo ou ocupando espaços. Há também aqueles aromas de cozinha, do macarrão de domingo, dos bolinhos de chuva ou mesmo da carne de panela ou do bife, empestando a casa toda.

Com os olhos da imaginação, elas são percebidas com toda a sua exuberância e beleza, pois as mães sempre são lindas. As roupas podem ser simples, singelas ou até sofisticadas e de grife, mas são inconfundíveis, pois vêm das mães como modelos de referência.

Do toque da pele percebe-se a sutileza do sentir-se próximo, da mãe que acolhe, que acarinha, que põe no colo, que beija, que se aproxima sem medo.

Não existem palavras, por mais que se percorra o dicionário, que digam o que é ser mãe, quer seja ela presente ou mãe saudade. Os vocábulos fogem, quando se quer dizer tudo o que se sente, pois é impossível expressar o que só o coração sabe fazer. Portanto, neste dia das mães, quem as têm pode usufruir deste momento único, estando perto delas e para as que já partiram é bom saber que mães saudade são eternas, sempre presentes na alma e na vida dos seus filhos.

*

Querida Professora,

Me deixaste sem palavras e com os olhos cheio d´água. Fiquei emocionada com teu e-mail! Tu sabes que estou chegando ao fim desta etapa e fiquei muito feliz com o que escreveste sobre mim. Pode ter certeza que não estou saindo da faculdade somente com um diploma. Aprendi muito em todos os sentidos! Realmente aquele dia foi muito especial. Sou grata a ti pela grande professora que tu és com todos teus alunos. Como bem disseste sei que nossas mães estão eternamente em nossos corações. Obrigada por tudo e conte sempre com minha amizade!

domingo, 1 de maio de 2011

Tragédia é não lembrar com doçura

Para Francisco e todos nós*

A história é a seguinte. Ela era uma publicitária mineira de 36 anos que estava vivendo uma história de amor com todos os ingredientes que se sonha: reciprocidade, leveza, afinidades, planos e, pra completar, um filho na barriga. Engravidara de surpresa, e festejou. O homem com quem repartia esse conto de fadas também ficou emocionado com a notícia, e passaram a curtir cada passo rumo à nova etapa. Quando ela estava com sete meses de gravidez, ele morreu de uma hora para outra.

O horror da morte súbita de um amor e o êxtase de uma nova vida chegando: foi essa contradição emocional que, quatro anos atrás, viveu Cristiana Guerra, atualmente uma conhecida blogueira especializada em moda (www.hojevouassim.com.br). Cris transitou entre o céu e o inferno. Poderia ter se entregado à vitimização, mas fez melhor: transformou sofrimento em poesia.

Francisco nasceu dois meses depois, forte, saudável e órfão. Cris não se conformou com a ausência de um dos protagonistas da história, e foi então que começou a escrever cartas para que seu bebê lesse quando tivesse idade para tal. Nessas cartas, contou sobre quem era seu pai, como ela e ele se conheceram, e os problemas e alegrias pelos quais passaram durante o pouco tempo de convívio, algo em torno de dois anos de relacionamento. Esses textos, ilustrados com fotos do casal e complementados por alguns e-mails trocados, virou um livro, Para Francisco, da Editora Arx.

Cris me entregou esse livro em mãos dias atrás, quando a conheci em Belo Horizonte. É uma mulher charmosa, firme, bem-humorada. Participamos juntas de um evento e depois voltei ao hotel, onde dei as primeiras folheadas no livro. Na manhã seguinte, ele já havia sido devorado, e me senti agradecida pela oportunidade. Em tempos em que só se fala em amores fóbicos, ler o texto elegante e inteligente da Cris me fez ter uma nova perspectiva do que é tragédia. Tragédia é não lembrar com doçura.

A relação de Cris com o pai de seu filho não teve tempo para o desgaste e a falência. Tiveram alguns desencontros, mas nada que fraturasse a relação que era encantadora e sólida a seu modo. Não sei se duraria pra sempre, mas durou o suficiente pra montar a memória afetiva que estruturará a vida de um menino que conhecerá seu pai através da visão de sua mãe. Nunca havia pensado nisso: vemos nossos pais através dos olhos de nossas mães – estando eles vivos ou não.

A narrativa dessa vida-e-morte simultâneas é contada com desembaraço, emoção e nenhuma pieguice, mesmo tendo todos os elementos para virar um dramalhão. Mas Cris Guerra não deixou a peteca cair e, além de um belo livro, nos deixou um recado valioso: a vida não apenas continua, ela sempre recomeça.

*Coluna da Martha Medeiros deste domingo 1 de maio de 2011. Para Franciscos, Natálias, Marianas, Joãos, Marias....etc.
Dedico para a querida Mari Duda!!!